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A Lei da Ficha Limpa foi um avanço na conquista civilizatória da sociedade brasileira. Mais do que isso, o STF decidiu que a presunção de inocência não tem alcance absoluto e, em sintonia com países desenvolvidos, absorveu a tese de que é possível executar penas após decisões proferidas por órgãos colegiados em segundo grau de jurisdição.
Antes disso, era necessário aguardar o trânsito em julgado das decisões penais condenatórias, o que demorava uma eternidade em face de recursos protelatórios e manobras que o sistema jurídico brasileiro admite.
Governantes tendem a ser criteriosos com nomeações,s quando se trata de pessoas que respondem a processos criminais ou ações de improbidade. No entanto, deve-se refletir com cautela sobre o uso abusivo dos processos como se fossem penalidades antecipadas. Inviável aceitar processos punitivos calcados em leves indícios, mormente quando as instituições fiscalizadoras detém poderes investigatórios robustos.
Além disso, processos judiciais ou administrativos não podem servir como instrumentos para destruir reputações, pura e simplesmente. Por isso, a mera existência de um processo contra alguém, seja pessoa física ou jurídica, não significa, por si só, um juízo de censura.
Importante averiguar as provas carreadas nos autos e a plausibilidade da pretensão punitiva do Estado. Fundamental perceber que, para além dos processos, existe a perspectiva crescente de cobrança de resultados em relação à máquina estatal acusatória.
Os balizadores do sistema normativo vigente são rigorosos: a legislação permite execução da pena a partir de decisão de tribunais ordinários e medidas cautelares com fundamento em evidência do direito invocado.
É hora de se cobrar a qualidade do poder investigatório das autoridades, para que o pilar da segurança jurídica seja resguardado ao máximo. Índices de impunidade serão reduzidos na medida em que as instituições funcionarem de modo integrado e reunirem provas.
Por certo, colaborações premiadas desprovidas de elementos de corroboração tendem a conduzir à desmoralização da própria lei e das instituições que a manejam. Se uma autoridade investiga por longo período determinado alvo, inviável que possa ofertar denúncia calcada em leves indícios, e tal parâmetro serve tanto ao âmbito penal quanto ao direito administrativo sancionador.
O papel da imprensa é noticiar e exercer o jornalismo investigativo, abrindo espaço ao contraditório substancial. Danos colaterais existem e são inerentes ao meio político e econômico, dado que escândalos decorrem de processos e investigações, mas o princípio da responsabilidade também é correlato e deve ser proporcionalmente aquilatado.
Inexiste, todavia, espaço à censura, seja de que natureza for. O que se deve valorizar é a qualidade da formação da opinião pública, dos processos punitivos, do poder investigatório e dos mecanismos de controle. O fato de alguém submeter-se a uma investigação ou a um processo não é fator excludente da cidadania, muito menos um atestado de culpabilidade. O modelo jurídico brasileiro já é suficientemente rigoroso para que se avance o sinal e se construam instrumentos draconianos adicionais incompatíveis com qualquer regime democrático.
Todavia, ao emergir fatos graves, cabe à opinião pública, ao jornalismo e aos governantes, através de análises criteriosas e prudentes, adotar as medidas cabíveis, dentro de suas esferas de competências.
Sempre é bom lembrar que o Executivo ostenta o chamado espaço discricionário de decisão. E a sociedade pode avaliar seus governantes de modo aberto, crítico e plural, por seus canais, a partir de uma consciência cada vez mais rica e inteligente.
Em síntese, não é qualquer processo, ou investigação, que maculará a vida de uma pessoa jurídica ou de um homem público. Porém, não é necessário aguardar o desfecho de uma investigação ou de um processo para que se saiba que alguma providência há de ser adotada, quando se tem elementos concretos em face de fatos robustamente comprovados e graves.
Fábio Medina Osório é advogado e ex-ministro da Advocacia-Geral da União
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