TJRN se baseia em Fábio Medina Osório para decisão sobre Improbidade

Diário Oficial DJ Rio Grande do Norte – Justiça: 17/07/2013 
Tribunais Superiores: 16/07/2013

Vencimento da assinatura: 25/07/2013

 
 

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Data de Publicação: 17/07/2013

Jornal: Diário Oficial DJ Rio Grande do Norte

Caderno: TJRN

Local: – JUDICIARIO  
          Tribunal de Justiça do RN – DJe. Secretaria Vara / 4ª Vara da Fazenda Pública / Fórum – Miguel Seabra Fagundes / Comarca – Natal  

Página: 00606

RELACAO N 0166/2013

ADV: LUCIA DE FATIMA DIAS FAGUNDES (OAB 2223/RN), CAMILA OCTAVIO BEZERRA (OAB 7839/RN), JACIRATAN DAS GRACAS DE AGUIAR RAMOS FILHO (OAB 8000/RN), HERIBERTO ESCOLASTICO BEZERRA JUNIOR (OAB 1894/RN) – Processo 0106668-77.2011.8.20.0001 – Acao Civil de Improbidade Administrativa – Violacao aos Principios Administrativos – Autor: Ministerio Publico do Estado do Rio Grande do Norte – Reu: Wellington Moreira de Azevedo – Heriberto Escolastico Bezerra – ACAO CIVIL DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA Nº: 0106668-77.2011.8.20.0001 AUTOR: MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE PROMOTORES DE JUSTICA: EUDO RODRIGUES LEITE E OUTROS REUS: WELLINGTON MOREIRA DE AZEVEDO E OUTRO ADVOGADOS: HERIBERTO ESCOLASTICO BEZERRA JUNIOR, JACIRATAN DAS GRACAS DE AGUIAR RAMOS FILHO E OUTROS DECISAO O MINISTERIO PUBLICO ajuizou Acao de Improbidade Administrativa contra HERIBERTO ESCOLASTICO BEZERRA e WELLINGTON MOREIRA DE AZEVEDO, afirmando, em sintese, que os demandados cometeram ato de improbidade administrativa previsto no art. 11 da Lei nº 8.429/92, lesionando os principios da moralidade e da legalidade. Ao deduzir sua pretensao, o orgao autor sustenta que a partir de investigacao levada a efeito para fins de apurar pratica de ato de improbidade por servidores publicos que estariam exercendo a advocacia na condicao de impedidos legais, restou provado que o demandado Wellington Moreira, ocupante do cargo em comissao de Coordenador da Assessoria Tecnica da Secretaria de Seguranca Publica promoveu a defesa do Cel. Marcondes Rodrigues em tres acoes civis publicas. Ja o demandado Heriberto Escolastico Bezerra, na condicao de advogado contratado da POTIGAS, promoveu a defesa de Pedro Holanda Filho, Joaquim Tomaz de Araujo e Jose Geraldo Saraiva Pinto em acao de improbidade administrativa. Entende o autor que o primeiro demandado estava impedido do exercicio da advocacia, em razao da sua nomeacao para o cargo comissionado. Ja o segundo demandado prestava servicos de assessor juridico da Companhia Potiguar de Gas, mediante contrato, mas que se inclui na situacao prevista no art. 2º da LIA. Segundo a inicial, os demandados, mesmo estando legalmente impedido para o exercicio da advocacia, atuaram nos seguintes processos: Processo nº 001.08.029222-5, Processo nº 001.08.029227-6, Processo nº 001.09.002349-8. Por tal razao, entende o autor que os demandados violaram os principios da legalidade e da moralidade,, o que configura ato de improbidade previsto no art. 11 da Lei nº 8.429/92, pois agiram com desonestidade para com o Estado do Rio Grande do Norte, ente a que estavam vinculados. Pede ao final a imposicao das sancoes previstas no inciso III do art. 12 da LIA. Juntou documentos. O Estado do 01456900 Rio Grande do Norte, instado a se manifestar no feito, compareceu aos autos atraves da peticao de folhas 318/319 e documentos anexos, e declarou nao ter interesse em figurar na presente acao de improbidade. Os demandados apresentaram suas manifestacoes preliminares e juntaram documentos. Este Juizo, tendo em vista a ausencia de manifestacao de interesse do Estado do Rio Grande do Norte, declinou a sua competencia para conhecer e julgar a demanda. Os autos foram remetidos ao Distribuidor, sendo entao remetidos para o Juizo da 17ª Vara Civel de Natal. Aquele Juizo suscitou conflito de competencia, tendo o Tribunal de Justica declarado ser competente esta 4ª Vara da Fazenda para o julgamento da demanda. E o relatorio. Trata-se de acao de improbidade administrativa onde o autor postula a aplicacao das sancoes previstas no inciso III do art. 12 da Lei nº 8.429/92 em desfavor dos demandados, pelo que entende ter sido ato de improbidade administrativa (art. 11 da LIA) o fato de terem os mesmos, na condicao de advogados, defendido interesses de terceiros em acoes civis que tramitam nesta Comarca, quando exercia cargo comissionado na Administracao Pùblica (o demandado Wellington Moreira) e contrato de servicos juridicos em empresa publica (o demandado Heriberto Escolastico). Ao apresentar sua defesa preliminar, o demandado Heriberto Escolastico Bezerra sustentou que a acusacao do autor esta baseada em premissa nao verdadeira. Defendeu que nao existe impedimento legal para o exercicio da advocacia e que nao houve pratica ilegal da advocacia. Afirma que nao estava impedido de atuar na defesa dos reus na Acao Civil nº 001.08.029222-5, posto que nao se enquadra em nenhuma das hipoteses legais de impedimento, previstas no art. 30 da Lei nº 8.906/94 – Estatuto da Advocacia. Argumenta que a inicial sonegou a informacao de que o demandado nao e servidor, empregado ou contratado, como pessoa fisica, da POTIGAS, nao recebe remuneracao como tal e nem e membro do Poder Legislativo. Informa que quem mantinha relacao contratual com a referida sociedade era a Sociedade Civil Heriberto Bezerra Advogados Associados, pessoa juridica de direito privado, na qual o demandado figura como um dos socios. Defende que a acusacao e fruto de equivoco do autor, e que inexiste justa causa para o recebimento da presente acao. Menciona a decisao proferida no Processo nº 001.08.029222-5, que tramitou nesta 4ª Vara da Fazenda, e que nao foi recebida, e contra a qual nao houve recurso do Estado ou da POTIGAS. Entende ausentes elementos subjetivos e objetivos de forma a caracterizar a tipicidade do ato improbo sustentado pelo autor. Menciona julgados e conclui que nao houve violacao aos principios da moralidade e da legalidade, muito menos conduta desonesta ou ilegal, pugnando pela rejeicao da acao. Analisando a manifestacao do Estado do Rio Grande do Norte quando declinou da sua intervencao no feito, observa-se que nos documentos acostados pelo ente publico atraves da peticao de folha 321, encontra-se a manifestacao exarada pelo Exmo. Sr. Procurador Geral do Estado, onde, apos transcrever doutrina de varios juristas, aquele autoridade, em trecho que merece transcricao, assim se posicionou sobre a presente acao de improbidade em relacao do demandado Heriberto Escolastico Bezerra: “Procedi a leitura da peticao inicial e da defesa apresentada por um dos demandados, no caso o Dr. Heriberto Escolastico Bezerra, e, s.m.j., nao vislumbro, ao menos neste momento, ter como existente, pelo menos em relacao ao referido e ilustre advogado, o elemento subjetivo do tipo, qual seja, o dolo. Uma coisa e certa: a POTIGAS nao tinha contrato com a pessoa natural de Heriberto Escolastico Bezerra. Tinha com a pessoa juridica, no caso Heriberto Bezerra Advogados Associados. Sao pessoas distintas. Uma, pessoa natural, outra pessoa juridica. Na inicial essa questao nao foi esclarecida. Quem prestava servicos a POTIGAS era uma pessoa juridica. Esse fato parece-nos relevante. {…}. Uma coisa parece-me certa: tanto a doutrina quanto a jurisprudencia do STJ associam a improbidade administrativa a nocao de desonestidade, de ma-fe do agente publico. Nao vi na conduta do Dr. Heriberto Escolastico Bezerra ato improbo, desonesto, de safadeza, de ma-fe. Natal e o Rio Grande do Norte o conhecem. E um homem que ja ocupou inumeros cargos publicos e seu comportamento, sempre, foi elogiavel. Nunca havia sido acusado de nada. {…} Assim, ante o exposto, nao estando convencido, numa analise perfunctoria, feito neste instante, do dolo praticado pelos demandados, sugiro a ilustre Procuradora do Estado que abstenha-se de ingressar no polo ativo da acao e, se julgar oportuno, explique ao Juiz as razoes desse posicionamento.” A constatacao do ilustrado Procurador Geral do Estado – sem favor, um dos mais brilhantes causidicos deste Estado – quanto a ausencia de dolo, nao e diferente da que faco neste momento em relacao ao demandado Heriberto Escolastico Bezerra. Com efeito, a inicial, ao descrever a conduta dita improba, atribuida ao demandado, sustentou que este “na condicao de advogado contratado pela Companhia Potiguar de Gas – POTIGAS, promoveu a defesa processual de Pedro Holanda Filho, Joaquim Tomaz de Araujo e Jose Geraldo Saraiva Pinto, acusados de improbidade administrativa em acao civil publica impetrada na defesa do patrimonio publico da referida sociedade de economia mista.” Mas adiante, a inicial afirma que o demandado “prestava servicos de assessor juridico da Companha Potiguar de Gas – POTIGAS, atividade regulamentada mediante contrato firmado pelo menos desde 25 de abril de 2008, e que foi objeto de prorrogacoes.” Mais adiante, em outro trecho, a inicial afirma que “Em 6 de novembro de 2008, o demandado Heriberto Escolastico Bezerra fez a juntada de peticao de defesa previa em nome de Pedro Holanda Filho, Joaquim Tomaz de Araujo e Jose Geraldo Saraiva Pinto, acompanhada dos respectivos instrumentos de procuracao.” Ou seja, a inicial atribui a pessoa fisica do advogado Heriberto Bezerra a pratica da lesao aos principios da legalidade e moralidade, consistente numa atitude desleal para com a Administracao Publica, que tipificaria o ato improbo previsto no art. 11 da LIA. Ocorre que quando solicitadas a POTIGAS, pelo Ministerio Publico, atraves do Oficio nº 413/08-44PJ/SEC (folha 86 dos autos), informacoes acerca da atividade do demandado (se e ou foi contratado pela POTIGAS), aquela Companhia respondeu, atraves do documento de folhas 89/90 (assinado pelo seu Diretor-Presidente), que o contrato de prestacao de servicos profissionais especializados de advocacia, assessoria e consultoria juridica foi firmado entre a POTIGAS e o escritorio HERIBERTO BEZERRA ADVOGADOS ASSOCIADOS, inscrito no CNPJ sob nº 05.550.432/0001-90. As folhas 91 e seguintes dos autos encontram-se o contrato de prestacao de servicos profissionais especializados de advocacia celebrado entre a POTIGAS e a empresa HERIBERTO BEZERRA ADVOGADOS ASSOCIADOS, CNPJ 05.550.432/0001-90, bem como os seus aditivos. Na copia dos autos da Acao Civil nº 001.08.029222-5, que acompanha a inicial e que tramitou nesta Vara, encontra-se a defesa preliminar (folhas 223/227) ofertada pelos entao demandados Pedro Holanda Filho, Joaquim Tomaz de Araujo e Jose Geraldo Saraiva Pinto, na referida acao, subscrita pelos advogados Heriberto Escolastico Bezerra (OAB/RN 272) e Flavia Ramalho Vergara (OAB/RN 6000), bem como os respectivos instrumentos de procuracao outorgados pelos entao demandados aos citados advogados (folhas 228/230. Como se observa, o contrato celebrado pela POTIGAS nao foi com a pessoa fisica do advogado Heriberto Bezerra, mas sim com a pessoa juridica HERIBERTO BEZERRA ADVOGADOS ASSOCIADOS, da qual o advogado e um dos socios. Uma segunda constatacao e feita a partir do referido contrato: o demandado Heriberto Bezerra nao era servidor (vinculo estatutario) nem empregado (vinculo celetista) nem contratado como pessoa fisica da POTIGAS ou do Estado do Rio Grande do Norte. Resta, pois, indagar se estaria, a pessoa fisica do advogado Heriberto Escolastico Bezerra, impedido de advogar na defesa dos demandados Pedro Holanda Filho, Joaquim Tomaz de Araujo e Jose Geraldo Saraiva Pinto na Acao Civil Publica nº 001.08.029222-5, pelo fato da pessoa juridica da qual e socio ser contratada da POTIGAS, empresa da qual os demandados naquela acao civil eram diretores.. Na sua defesa preliminar, o demandado Heriberto Bezerra sustenta que nao estava ou nao esta impedido de atuar na defesa dos reus na acao civil publica mencionada, posto que nao se enquadra em nenhuma das hipoteses legais de impedimento, previstas no art 30 da Lei nº 8.906/94 (Estatuto da Advocacia), que assim dispoe: “Art. 30. Sao impedidos de exercer a advocacia: I – os servidores da administracao direta, indireta e fundacional, contra a Fazenda Publica que os remunere ou a qual seja vinculada a entidade empregadora; (grifamos) II – os membros do Poder Legislativo, em seus diferentes niveis, contra ou a favor das pessoas juridicas de direito publico, empresas publicas, sociedade de economia mista, fundacoes publicas, entidades paraestatais ou empresas concessionarias ou permissionarias de servico publico. De logo, constata-se que o demandado Heriberto Bezerra nao se enquadra na hipotese do inciso II do referido art. 30 do EAOAB, uma vez que nao e membro do Poder Legislativo. Restaria, entao, averiguar se incidiria no impedimento para o exercicio da advocacia tratado no inciso I do mesmo dispositivo. Consoante se le claramente, tal dispositivo (inciso I do art. 30, EAOAB) refere-se taxativamente a servidores publicos (vinculo estatutario) da administracao direta, indireta ou fundacional. Ja se viu que o demandado nao se enquadra nessa situacao, pois nao e servidor estatutario da Administracao Publica Estadual. Tambem nao era empregado (vinculo celetista) da POTIGAS, que e uma sociedade de economia mista criada por lei (Lei Estadual nº 6.502/93). Nao tinha, pois, nenhum vinculo de natureza juridico-funcional, quer com o Estado do Rio Grande do Norte, quer com aquela sociedade de economia mista. O art. 30 do Estatuto da Advocacia (Lei nº 8.906/94) tratou do instituto do impedimento para o exercicio da advocacia. Diferentemente da incompatibilidade, que e a proibicao total ao exercicio da advocacia (tratada nos artigos 27 a 29 do EAOAB), o impedimento (art. 30, I e II do EAOAB) e a proibicao parcial ao exercicio da advocacia. Isto significa dizer que o advogado que se encontrar em situacao que gere impedimento, mesmo que esteja inscrito nos quadros da OAB e tenha anotado em seus registros tal situacao, apenas no ambito do impedimento e que nao podera exercer a advocacia. Ou seja, a vedacao e restrita apenas a que venha a exercer a advocacia em determinadas causas, nao havendo nenhum obice para advogar fora do ambito do impedimento. Analisando as duas hipoteses de impedimento do art. 30 (incisos I e II) do EEAOAB, observa-se que a primeira (inciso I) e aquela que se pode chamar de impedimento de ordem moral e economica, pois aquele que for advogado e tambem servidor ou empregado publico (estatutario ou celetista) da administracao direta, indireta e fundacional, nao podera advogar contra a Fazenda Publica que os remunera (estatutario) ou a qual esteja vinculada a entidade empregadora (celetista). O fundamento, como se percebe, e de ordem moral e economica, pois nao seria admissivel que os servidores publicos (estatutarios) ou os empregados publicos (celetistas) possam patrocinar causas contra a propria Fazenda Publica que os remunera, ja que dela fazem parte e tambem dela recebem remuneracao. Ou seja, o impedimento e restrito, referindo-se exclusivamente a Fazenda Publica. A interpretacao, na hipotese, nao poderia ser outra que nao a autentica, isto e, aquela dada pelo proprio legislador, pois foi ele quem deu a precisa e taxativa definicao das hipoteses de impedimento no referido diploma legal. Portanto, fora das hipoteses taxativamente previstas em lei nao havera impedimento para o exercicio da advocacia de forma privada. Em outras palavras, o servidor (estatutario) ou empregado (celetista) que tambem for advogado estara impedido, apenas, 01456900 de exercer advocacia contra a Fazenda Publica que os remunere. Jamais podera ser impedido de exerce-la de forma privada. Ja a segunda hipotese (inciso II) e aquela que cuida do impedimento de ordem moral e politica, referindo-se expressamente aos membros do Poder Legislativo (em seus tres niveis), nao podendo os parlamentares exercer a advocacia contra ou a favor das pessoas juridicas de direito publico, empresas publicas, sociedades de economia mista, fundacoes publicas, entidades paraestatais ou concessionarias e permissionarias de servicos publicos. A rigor, o impedimento ocorre desde a posse, nos termos do art. 54, inciso II, “c”, da Constituicao Federal. Ve-se, pois, que o impedimento para o exercicio da advocacia foi tratada pelo legislador de forma taxativa, sem qualquer referencia a conceitos genericos e indeterminados nem possibilidades de acrescimos. E a lei regulamentar da advocacia nao contempla impedimento ao exercicio privado do advogado socio de pessoa juridica contratada por entidade publica, ainda que venha a atuar na defesa de pessoas demandadas por atos de improbidade administrativa. Tambem o Codigo de Etica e Disciplina da OAB nao contempla situacao que possa causar tal impedimento, Ao contrario, prega referido Codigo que o advogado vinculado ao cliente ou constituinte, seja por relacao empregaticia ou contrato de prestacao de servicos, ou integrante de departamento ou orgao de assessoria juridica, publico ou privado, deve zelar pela sua liberdade e independencia (art. 4º, Codigo de Etica). Nem mesmo a Lei nº 8.429/92 contemplou tal hipotese, em seus artigos 9º e 10, como ato de improbidade. E por esta razao que o orgao autor busca enquadrar a conduta do advogado Heriberto Escolastico Bezerra no ambito dos conceitos indeterminados de que trata o art. 11 da LIA. Como visto anteriormente, o demandado Heriberto Escolastico Bezerra e socio da pessoa juridica Heriberto Bezerra Advogados Associados. E essa pessoa juridica foi contratada pela POTIGAS, nos termos do 25, II c/c art. 13, da Lei nº 8.666/93, em face da notoria especializacao da contratada, consoante Clausula Primeira do contrato de prestacao de servicos profissionais especializados de advocacia (folhas 91/101). Assim, se o advogado Heriberto Escolastico Bezerra nao faz parte dos quadros de servidores publicos do Estado (advogado publico estatutario), muito menos e empregado publico (advogado publico celetista) e, menos ainda, foi ele, diretamente como fisica, o contratado, nao estaria impedido do exercicio da advocacia em carater privado na defesa dos reus na ja citada acao civil publica, ainda que nela o Estado do Rio Grande do Norte tenha manifestado interesse. Alias, nesse ponto convem lembrar que mesmo o advogado contratado diretamente, como pessoa fisica, por inexigibilidade de licitacao, na forma do art. 25, II, da Lei das Licitacoes (Lei nº 8.666/93), para emitir parecer juridico (art. 13, II, Lei 8.666/93), ou para patrocinio ou defesa de causas juridicas ou administrativas (art. 13, V, Lei 8.666/93), nao perde e nem perdera, so por isso, sua condicao de advogado privado, pois e exatamente por isso que e contratado, para colaboracao com o Poder Publico, nao se lhe podendo ser aplicado os impedimentos do inciso I do art. 30 do EAOAB, ate porque recebera honorarios, como retribuicao, exatamente em razao do trabalho especifico. Nao recebera vencimentos ou salarios, mas honorarios, o que denota o carater privado do seu trabalho. O certo e que o contrato entre a POTIGAS e a pessoa juridica de Heriberto Bezerra Advogados Associados nao poderia, por si so, impedir o exercicio profissional da advocacia pelo advogado Heriberto Bezerra, socio da pessoa juridica, na defesa de reus, pessoas fisicas, em qualquer acao judicial, ainda que nela tenha ingressado o Estado ou a propria sociedade de economia mista contratante. A uma, porque a defesa dos reus na acao civil publica nao e uma atuacao contra a Fazenda Publica, mas sim a defesa de interesses privados dos demandados. A duas, porque o advogado, como pessoa fisica, nao esta sendo remunerado, neste caso, pelo Poder Publico A tres, porque a eventualidade de uma contratacao da pessoa juridica da qual e socio o advogado nao permite que este seja considerado servidor ou empregado publico. Ao comentar sobre os sujeitos ativos dos atos de improbidade, EMERSON GARCIA prega que “o conceito de agente publico encampado pela Lei nº 8.429/92, em que pese sua amplitude, nao alcanca os advogados. {…}. Resta examinar se o servico publico e a funcao social exercida junto ao Poder Judiciario guardam similitude com as figuras do art. 2º da Lei de Improbidade. Ainda aqui, nao vislumbramos a possibilidade de serem aplicadas ao advogado as sancoes da Lei nº 8.429/92. {…} Constata-se que o advogado efetivamente exerce uma “funcao publica”, sendo indispensavel a administracao da Justica e, por via reflexa, a propria consecucao da atividade finalistica do Poder Judiciario. No entanto, esta “funcao publica” nao guarda similitude com aquele prevista no art. 2º da Lei nº 8.429/92, ja que esta ultima pressupoe a existencia de uma relacao juridica de natureza funcional com as entidades elencadas no art. 1º da Lei de Improbidade.” (grifamos) Ou seja, o advogado, na sua atividade privada – mesmo que considerada “funcao publica”, posto que indispensavel a administracao da Justica, consoante art. 133, CF – nao pode ser considerado agente publico para fins de improbidade, pois nao tem nenhuma relacao funcional, nos termos do art. 2º da LIA, com as entidades mencionadas no art. 1º da mesma Lei. Repita-se, entao: o demandado Heriberto Escolastico Bezerra nao se enquadra em nenhuma das hipoteses do art. 2º da LIA, pois nao exercia mandato, cargo, emprego ou funcao na POTIGAS ou no Estado do Rio Grande do Norte, e nem mesmo foi contratado, como pessoa fisica, para a prestacao de servicos de advocacia. Portanto, nao ha conflito de interesses em decorrencia de sua atuacao profissional privada no caso citado. Por outro lado, ainda que se possa aventar a possibilidade de a pessoa juridica ser agente ativo de ato de improbidade, nos termos do art. 3º da LIA, jamais se poderia afirmar que a pessoa juridica contratada pela POTIGAS concorreu de alguma forma para a pratica do ato de improbidade, pois nao e a pessoa juridica quem patrocina a defesa dos reus privados na acao civil publica ja mencionada, mas sim a pessoa fisica do advogado Heriberto Escolastico Bezerra. Portanto, nao se pode acolher a tese de que a pessoa fisica do advogado Heriberto Escolastico Bezerra estava impedido para o exercicio da advocacia somente pelo fato de ser socio da pessoa juridica Heriberto Bezerra Advogados Associados. A pessoa juridica nao se confunde com a pessoa fisica, e o fato da contratada ter sido a pessoa juridica nao torna o seu socio, automaticamente, servidor ou empregado publico ou terceiro vinculado a Administracao Publica e, portanto, sujeito as sancoes por improbidade administrativa. Ou seja, a nitida eventualidade da relacao contratual estabelecida entre a POTIGAS e a pessoa juridica, da qual o advogado e socio, jamais podera permitir que o socio seja considerado servidor ou empregado publico ou particular em colaboracao com a Administracao. Ate porque se tal ideia prevalecesse, todos os socios das milhares de empresas contratadas diariamente pelo Poder Publico estariam automaticamente qualificados como servidores publicos. E servidor publico, como bem define CARMEN LUCIA ANTUNES e “a pessoa fisica que participa de uma relacao juridica trabalhista de carater nao eventual com uma pessoa estatal sob regime de direito publico ou determinado por principios de direito administrativo, investindo-se em cargo publico de natureza civil.” Em casos de contornos assemelhados – tratando de defensor dativo – o Supremo Tribunal Federal entendeu que “a eventualidade da relacao juridica estabelecida entre a Administracao e o advogado dativo nao permite que seja este considerado servidor publico.” (Reclamacao nº 7.592/MT, rel. Min. Carmen Lucia, DJe 18/06/2010). Ou seja, tomando esse posicionamento como parametro de analise da situacao dos autos, o fato do advogado Heriberto Escolastico Bezerra ser 01456900 socio da pessoa juridica contratada pela POTIGAS nao tem o condao de construir entre o advogado e a Administracao Publica uma relacao de natureza juridica-administrativa que o levasse a ficar impedido de advogar, nos termos do inciso I do art. 30 da Lei nº 8.906/94 (EAOAB), na defesa de reus demandados em acao civil publica onde o Estado manifestou interesse. Portanto, do ponto de vista legal, nao existe nenhum impedimento. Se assim nao fosse, todo e qualquer reu em acao de improbidade ou, em casos mais graves, em acao penal por crimes contra a administracao publica, jamais poderia ser defendido por defensor publico ou defensor dativo, sempre chamados para suprir as deficiencias de pessoal da defensorias publica, pratica comum neste Pais. E tais ilicitos – civil ou penal – sao sempre praticados em detrimento da administracao publica. Portanto, no caso do advogado Heriberto Escolastico Bezerra nao houve lesao ao principio da legalidade (no caso, ao inciso I do art. 30 da Lei nº 8.906/94), a ponto de tipificar o ato improbo do art. 11 da LIA. Afasto, pois, a tese do orgao autor, de que o advogado Heriberto Escolastico Bezerra estava impedido de exercer a advocacia no caso apontado (defesa dos reus Pedro Holanda Filho e outros na acao civil publica referida). Nao se aplica ao demandado, neste caso, a regra do art. 2º da Lei nº 8.429/92, pois nao foi o advogado contratado como pessoa fisica pela POTIGAS. E importante observar que o termo “contratacao”, constante do art. 2º da Lei nº 8.429/92, nao pode abranger a pessoa fisica do advogado, pois nao foi ele o contratado, mas sim a pessoa juridica. Tal termo nao pode ser lido dissociado da situacao funcional do agente publico – mandato, cargo, emprego ou funcao – que pode se dar por eleicao, nomeacao, designacao, contratacao ou qualquer outra forma de investidura. Essa contratacao pressupoe a investidura do agente publico submetido ao regime da Consolidacao das Leis do Trabalho (CLT). E utilizada em contraposicao a nomeacao, que expressa o vinculo juridico estatutario. Mas tais vinculos com o Poder Publico nao detem o demandado. A contratacao tambem pode se dar em decorrencia de um contrato de direito publico, conforme regulado no art. 13 da Lei nº 8.666/93, mas o demandado nao foi contratado dessa forma como pessoa fisica. Em, suma, nao existia e nem existe nenhum vinculo juridico da pessoa fisica do advogado Heriberto Escolastico Bezerra com a POTIGAS ou com o Estado do Rio Grande do Norte. Portanto, se o demandado Heriberto Escolastico Bezerra, como pessoa fisica, nao se encontrava em nenhuma dessas situacoes, e se nao havia impedimento legal ao exercicio da advocacia (inciso I do art. 30 do EAOAB), nao ha falar em lesao ao principio da legalidade e, por conseguinte, em lesao ao art. 11 da LIA. Tambem nao enxergo na conduta do demandado “comportamento desonesto e desleal, ensejador de improbidade administrativa”, como sustenta o autor, de modo a configurar lesao ao principio da moralidade . Se nao havia nenhum impedimento ao exercicio da advocacia por parte do demandado, nao se podera afirmar que se esta diante de um comportamento desonesto e desleal. E preciso ter muito cuidado na avaliacao de situacoes onde se sustenta ter havido comportamento desonesto e desleal, pois como afirmado por MEDINA OSORIO “e evidente que nao se pode imputar ato de improbidade a alguem em face da pura e simples violacao de principios, nao obstante a diccao do art. 11 da LGIA. Ha que se exigir requisitos complementares, de carater democratico, sistemico e juridico” No caso em apreco, para que existisse improbidade administrativa no atuar do demandado Heriberto Escolastico Bezerra, seria necessario que tivesse havido lesao frontal a Lei nº 8.906/94 (inciso I do art. 30), ate porque o orgao autor sustenta que o atuar profissional do demandado se deu “descumprindo flagrantemente os dispositivos do Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil que instituem as hipoteses de incompatibilidade e impedimento para o exercicio da advocacia.” Mas, como se viu, tal descumprimento nao houve, pois nao havia impedimento. Consoante a laboriosa licao de FERNANDO CAPEZ, cabe ao interprete e aplicador do Direito a ardua tarefa de limitar o alargado tipo de improbidade administrativa do art. 11 da LIA, trazendo limitacoes materiais a sua incidencia, sob pena de se abarcar um infindavel numero de atos administrativos, engessando a engrenagem da maquina publica. Dai a imperiosa necessidade, como sustenta o autor, da investigacao ontologica do tipo, pois “O ato de improbidade nao e apenas aquilo que o legislador diz se-lo (conceito formal), uma vez que nenhuma conduta pode, materialmente, ser considerada ilicita se, de algum modo, nao colocar em perigo valores fundamentais da sociedade.” Diferente nao e o pensamento de FABIO MEDINA OSORIO, para quem “a improbidade requer um processo laborioso e sofisticado, considerando a estrutura das normas que integram a LGIA. Nao se pode, por razoes de seguranca juridica, legalidade, tipicidade e fundamentos do Estado Democratico de Direito, imputar improbidade administrativa a alguem, formulando uma acusacao de vulneracao isolada dos ditames de qualquer dos textos da LGIA, porque a incidencia desta depende, de modo visceral, da previa violacao de outras normas. Trata-se, aqui, de formular uma exigencia de fundamentacao democratica da imputacao, assegurando-se o direito ao devido processo legal e, em especial, a ampla defesa.” (grifamos). Nesse sentido – ou seja, da necessidade de previa violacao de outras normas – diferente nao e a posicao do Superior Tribunal de Justica. Como paradigma, tomemos o acordao proferido no RESP 617.851/MG, Relator Ministra Eliana Calmon, DJ 19/12/2005, quando restou assentado que “[…} 1. Nao e possivel o julgamento de acao civil publica, em que se pugna pelo reconhecimento de ato de improbidade, sem que haja pronunciamento sobre a legalidade ou ilegalidade do ato administrativo questionado, o que configura omissao no julgado. 2. A afericao da inocorrencia de prejuizo ao erario, ma-fe, dolo ou culpa do administrador, por se tratar de questao subjacente e acessoria, nao pode ser feita entes do reconhecimento da ilegalidade ou inconstitucionalidade do ato administrativo, taxado de improbo. 3. Tal impossibilidade se torna evidente quando se observa que, de acordo com a jurisprudencia dessa Corte, o ato de improbidade se configura a partir de sua ilegalidade, independentemente de prejuizo ao erario, ma-fe, dolo ou culpa do agente administrativo” (destacamos). Em outras palavras, e necessario aferir inicialmente se o ato taxado de improbo foi ilegal ou inconstitucional, para so depois perquirir se houve ma-fe, deslealdade, desonestidade, dolo, prejuizo, etc. No mesmo sentido sao os seguintes julgados: RESP 261.691, RESP 439.280. Consoante ja se viu, nao houve ilegalidade, a luz do inciso I do art. 30 da Lei nº 8.906/94, no atuar do demandado Heriberto Escolastico Bezerra, posto que nao havia nenhum impedimento do exercicio privado da advocacia no caso da acao civil ja mencionada. Assim, nao houve, ao nosso sentir, lesao ou ofensa a moralidade. Apesar do orgao autor defender que o demandado Heriberto Escolastico Bezerra feriu frontalmente o principio da moralidade “descumprindo flagrantemente os dispositivos do Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil que instituem as hipoteses de incompatibilidade e impedimento para o exercicio da advocacia”, para que exista lesao ao principio da moralidade seria absolutamente necessario que tivesse existido lesao ao principio da legalidade, em razao do disposto no inciso I do art. 30 do EAOAB, ja que na hipotese uma coisa esta a depender da outra. Em outras palavras, o ato improbo por lesao a moralidade, na situacao, nao poderia se dar de forma isolada, sem a incidencia da regra regulamentar do exercicio da advocacia. Aplicando-se o raciocinio posto nas decisoes do STJ, acima mencionadas, e nas orientacoes doutrinarias, percebe-se que elas se amoldam com perfeicao a situacao dos autos, pois, como visto, nao houve lesao ao principio da legalidade no atuar profissional do demandado, e, por 01456900 conseguinte, nao se pode falar em lesao ao principio da moralidade. A proposito do tema, FABIO MEDINA OSORIO observa que “Nao pode existir improbidade administrativa por meio de violacao direta a normas da propria LGIA. Se aceitassemos tal hipotese, estaria aberta a via de uma grave inseguranca juridica. Os principios podem ostentar funcionalidade normativa de controle da validez dos atos administrativos, mas jamais uma funcao autonoma de suporte aos tipos sancionadores da Lei Federal 8.429/92. Um equivoco corrente da doutrina e precisamente o de atribuir aos principios essa funcionalidade de integrar a tipicidade da LGIA, sem referencia a uma previa intermediacao legislativa, equivoco que induz ou e induzido por argumentacoes juridicas precariamente compreendidas em sua essencia, num contexto de deficitaria visualizacao das funcoes normativas das regras e principios.” Essa mesma conclusao e apresentada de forma precisa por FERNANDO CAPEZ, quando observa que “Nem todo ato ilegal e imoral. Mas nao se pode reconhecer como ofensivo a moralidade administrativa ato que nao seja ilegal. Nao existe ato que seja legal e ofensivo a moralidade. So e ofensivo a moralidade administrativa porque ofende certos valores juridicizados. E porque ofende valores juridicizados, e ilegal. Ofender certos valores torna o ato especialmente viciado. Nao sera apenas qualificado como ilegal, mas tambem como ofensivo a moralidade administrativa.” Outra nao e a conclusao de MARCIO CAMMAROSANO, para quem a imoralidade administrativa constituiria “uma qualificadora da ilegalidade, de forma que, nao havendo nenhum vicio quanto a ilegalidade, afasta-se a circunstancia que a qualificaria especialmente.” Ou seja, em situacoes como a dos autos nao se poderia sancionar o agente publico por lesao a um mero preceito moral (principio da moralidade) sem que houvesse uma lesao a legalidade, que e o pilar do Estado Democratico de Direito. Como lembrar MEDINA OSORIO se aceita tal possibilidade “o proprio administrador ficaria exposto a acoes administrativas amparadas na moralidade e nao na juridicidade. Quando analisou o principio da moralidade em consonancia com a etica da legalidade, o Supremo Tribunal Federal entendeu que o principio da moralidade esta confinado no ambito da etica da legalidade, que nao pode ser ultrapassada, sob pena de dissolucao do proprio sistema (ADI 3.026, Rel. Min. Eros Grau, DJ 29.9.2006). Nesse julgamento, o entao Ministro Eros Grau observou que a consagracao do principio da moralidade no plano constitucional (art. 37, CF) e no plano infraconstitucional (segundo a lei que o contemplar, como no caso do art. 11 da Lei nº 8.429/92), nao significa uma abertura do sistema juridico para a introducao, nele, de preceitos morais. Segundo o notavel jurista, o que e importante observar ao considerarmos a funcao do direito positivo, ou seja, o direito posto pelo Estado, e que este o poe de modo a constituir-se a si proprio, enquanto suprema regra da sociedade civil, a ela conferindo, concomitantemente, a forma que a constitui. Desse modo, o sistema juridico “tem de recusar a invasao de si proprio por regras estranhas a sua eticidade mesma, advindas das varias concepcoes morais e religiosas presentes na sociedade civil, ainda que isto nao signifique o sacrificio de valoracoes eticas”. E conclui o eminente professor e jurista: “Ocorre, no entanto, que a etica do sistema juridico e a etica da legalidade. E nao pode ser outra, senao esta, de modo que a afirmacao, pela Constituicao e pela legislacao infraconstitucional, do principio da moralidade o situa, necessariamente, no ambito desta etica, etica da legalidade, que nao pode ser ultrapassada, sob pena de dissolucao do proprio sistema.” (grifamos) Nao se pode esquecer, tambem, que o principio da moralidade constitui um conceito indeterminado, com amplo espectro de vagueza e imprecisao. Taxar, de pronto, qualquer ato que nao seja lesivo a legalidade como ato atentatorio a moralidade administrativa – portanto, ato improbo -, mormente quando o comportamento do agente e desprovido de dolo, deslealdade, ma-fe, seria conferir a Lei nº 8.429/92 extensao incompativel com o sistema constitucional, pois afastaria a incidencia de todas as normas que regulam a atividade dos agentes publicos ou privados que exercam funcoes publicas. A aceitar-se tal raciocinio, o Estatuto do Advogado jamais poderia ser aplicado, na situacao dos autos, para sindicar a conduta profissional do demandado, ou seja, se houve lesao a alguma de suas regras no que pertine ao impedimento para o exercicio profissional. O autor sustenta, na inicial, que houve flagrante descumprimento ao Estatuto da Advocacia. Ora, o que se tem, na situacao em apreco, e uma regra juridica dotada de alto grau de determinabilidade: o inciso I do art. 30 da Lei nº 8.906/94 (EAOAB). Assim, nao e dificil sindicar a conduta do demandado diante do que posto nesta regra, para saber se houve ofensa a moralidade, porque uma vez desrespeitado o comando nela inserto, ter-se-ia a violacao. No caso, nao houve desrespeito, por parte do demandado Heriberto Escolastico Bezerra, aos dispositivos do EAOBA (Lei nº 8.906/94), como sustenta a inicial. Consequentemente, nao houve lesao a legalidade e a moralidade. Em conclusao, entendo que nao existiu ato de improbidade administrativa na conduta do demandado Heriberto Escolastico Bezerra, de modo que a lide, neste caso, considerada as provas ja contidas nos autos, deve ser julgada antecipadamente, nos termos do § 8º do art. 17 da Lei nº 8.429/92 Consoante se infere dos autos, devidamente aparelhados com farta documentacao, a pretensao do orgao autor e o reconhecimento da pratica de ato de improbidade, pelo demandado, em razao de ter “descumprido flagrantemente os dispositivos do Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil que instituem as hipoteses de incompatibilidade e impedido para o exercicio da advocacia.” Consoante se viu ao longo da fundamentacao, o demandado nao praticou ato improbo, consistente em lesao ao Estatuto da OAB. Ao contrario, a sua atuacao deu-se em consonancia com o inciso I do art. 30, da Lei nº 8.906/94, nao havendo, portanto, que se falar em lesao aos principios da legalidade e moralidade, de modo que a acao deve ser rejeitada e, via de consequencia, julgada improcedente. Com relacao ao demandado Wellington Moreira de Azevedo, o orgao autor sustenta que o mesmo, na condicao de servidor publico estadual, ocupante do cargo do comissao de Coordenador da Assessoria Tecnica da Secretaria de Seguranca Publica e Defesa Social, promoveu a defesa do Cel. Marcondes Pinheiro em tres acoes civis publicas, nas quais o Estado do Rio Grande do Norte figurou no polo ativo. Atraves da decisao interlocutoria de folhas 328/329, este Juizo consignou que o demandado nao havia apresentado defesa previa. No entanto, o demandado ofertou defesa preliminar, onde consigna que a defesa foi entregue na Secretaria da Vara em 27.05.2011, em meio fisico (papel), quando deveria ter sido entregue por meio eletronico. Diz ainda que nao houve qualquer resistencia da Secretaria da Vara em receber a defesa, e que nao houve qualquer manifestacao deste Juizo ou ato ordinatorio da recusa da referida peca processual. Pede que seja conhecida a defesa. Observo que realmente o demandado ofertou defesa previa na presente acao, mas o fez atraves do meio fisico, dentro do prazo legal, na forma do art. 191, do CPC, tendo a Secretaria da Vara recebido a peticao em 27 de maio de 2011, conforme se ve a folha 333 dos autos. O erro da Secretaria desta Vara nao pode prejudicar o direito de defesa do demandado, que deveria ter ofertado a defesa pelo meio eletronico. Assim, em tendo ocorrido erro da Secretaria, mas considerando a nitida intencao do demandado em promover sua defesa, considero-a como recebida, em obsequio ao principio do devido processo legal e da ampla defesa, albergados em sede constitucional. Em sua defesa, o demandado alega que em relacao ao Processo nº 001.08.029222-5, que tramitou nesta 4ª Vara da Fazenda, foi constituido defensor em 20.10.2008, e a peticao do Estado, intervindo no feito, ocorreu em 13.11.2008. Diz que a defesa previa do Cel. Marcondes teve por escopo comprovar que houve o ressarcimento do erario. Destaca ainda que a 01456900 manifestacao do Estado pugnou pelo nao recebimento da acao ou descaracterizacao da tese da peca inicial do autor da acao. Posteriormente, em 01/07/2009 e que o demandado foi intimado da manifestacao do Estado, e tao logo tomou conhecimento da situacao, adotou providencias visando substabelecer o mandato, sem reservas de poderes, em favor de outro advogado. Ressalta que este Juizo proferiu sentenca de merito, deixando de receber a acao civil por nao restar configurado ato de improbidade. Quanto ao Processo nº 001.08.029227-6, que tramitou na 2ª Vara da Fazenda, alega que a acao nao versa sobre dano ao erario estadual, e que a admissao do Estado no polo ativo da acao foi deferida em 01/07/2010, e nesta ocasiao o demandado foi cientificado do interesse do Estado, mas quase um ano antes, o Cel. Marcondes Pinheiro revogou o instrumento de mandato outorgado ao ora demandado, constituindo novo patrono. Informa ainda que o Juizo da 2ª Vara nao reconheceu ato de improbidade e indeferiu a inicial. Com relacao ao Processo nº 001.09.002349-9, que tramita na 2ª Vara da Fazenda, informa que foi constituido defensor do reu juntamente com o advogado Francisco Fernandes Borges Neto (OAB/RN 3230), o que se deu em 24.03.2009. Afirma que a defesa previa do Cel. Marcondes Pinheiro esta assinada apenas pelo segundo advogado, nao constando qualquer assinatura do demandado, e que o ingresso do Estado no polo ativo deu-se em 15.10.2010, ocasiao em que o demandado foi cientificado do interesse do ente publico, porem, mais de um ano antes, o Cel. Marcondes Pinheiro ja havia constituido outro advogado, de modo que o demandado nao interviu de forma substancial na lide. Destaca que na presente acao a propria Procuradoria Geral do Estado, instada a manifestar interesse, declinou da intervencao, por nao enxergar dolo na conduta dos demandados. Ao final, sustenta que nao tinha conhecimento do interesse do Estado nas acoes ja referidas, que suas intervencoes foram esparsas e insignificantes, caracterizadas por meros atos processuais de somenos importancia, que a Fazenda Publica atuou efetivamente nos feitos e que os juizos competentes, nos tres processos citados, entenderam nao restar configurados atos de improbidade, e pugnou pela rejeicao da acao. Analisando os documentos acostados a inicial pelo orgao autor, observa-se que a folha 104 encontra-se o Oficio nº 2448/2009-GS/SESED, de 08 de setembro de 2009, assinado pelo Secretario de Seguranca Publica, para fins de atender requisicao formulada pelo Ministerio Publico. Aquela autoridade informa que o demandado Wellington Moreira de Azevedo e servidor publico estadual, ocupante do cargo de provimento em comissao de Coordenador da Assessoria Tecnica da SESED, fazendo juntar a copia do ato de nomeacao publicada no Diario Oficial. A folha 105 encontra-se a copia do ato de nomeacao do demandado, datado de 09 de fevereiro de 2007 e publicado no DOE de 10 de marco de 2007 (folha 106). Segundo sustenta a inicial da presente acao, o demandado Wellington Moreira promoveu a defesa do Cel. Marcondes Pinheiro em tres acoes civis, mesmo exercendo cargo comissionado na SESED, e que o exercicio da referida funcao publica o torna impedido para o exercicio da advocacia quando houver conflito de interesses entre a causa patrocinada e os interesses da fazenda publica que o remunera, no caso, o Estado do Rio Grande do Norte. Segundo o autor, agindo desse forma o demandado teria cometido o ato de improbidade previsto no art. 11 da Lei nº 8.429/92, por violar os principios da legalidade e da moralidade, descumprindo flagrantemente os dispositivos do Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil. Para analisar se a conduta do advogado pode ser considerada lesiva a legalidade (inciso I do art. 30 da Lei nº 8.906/94) e, por conseguinte, a moralidade, como defende o autor, entendo necessario verificar o que ocorreu nas acoes civis em que o advogado atuou como defensor de um dos reus, o Cel. Marcondes Pinheiro. Na Acao Civil nº 001.08.029227-6, o Estado do Rio Grande do Norte pugnou pelo ingresso no polo ativo da demanda, nos termos do § 3º do art. 17, da Lei nº 8.429/92. Nesta acao, o demandado promoveu a defesa previa do reu em 01.12.2008. Referida acao teve sentenca prolatada pelo Juizo da 2ª Vara da Fazenda, que entendeu nao restar configurada a pratica de ato de improbidade e rejeitou a acao. Interposta apelacao pelo Ministerio Publico, o Tribunal de Justica do Estado (AC nº 2010.012769-9. Fonte: SAJ/TJRN), atraves de acordao prolatado em 25/04/2013 negou provimento ao recurso, mantendo a decisao de primeiro grau. Na referida acao, a atuacao do advogado Wellington Moreira limitou-se a promocao da defesa previa do reu Marcondes Pinheiro. Afirma o demandado que tao logo tomou conhecimento do ingresso do Estado, substabeleceu, sem reservas, os poderes da procuracao que lhe fora outorgada. Na Acao Civil nº 001.08.029222-5, que tramitou nesta 4ª Vara da Fazenda, o Estado do Rio Grande do Norte manifestou interesse em figurar no polo ativo da demanda. Nesta acao, o demandado Wellington Moreira promoveu a defesa previa do reu Marcondes Pinheiro. Posteriormente, em 06/07/2009, protocolou peticao, informando que tendo em vista a ciencia do despacho deste Juizo (folhas 309/310 daqueles autos) sobre o interesse do Estado, substabeleceu, sem reservas, os poderes que lhe foram outorgados. Referida acao nao foi recebida por este Juizo, tendo sido interposto recurso de apelacao pelo Ministerio Publico (AC nº 2010.014987-7. Fonte: SAJ/TJRN), que ainda nao foi julgado pela superior instancia. Na Acao Civil nº 001.09.002349-9, que tramitou na 2ª Vara da Fazenda, o Estado do Rio Grande do Norte pugnou pelo ingresso no polo ativo do feito. Nessa acao, apesar do nome do demandado constar na procuracao, a defesa previa foi assinada apenas pelo segundo advogado constante do instrumento procuratorio, Francisco Fernandes Borges Neto (OAB/RN-3230), e quando o Estado manifestou interesse no feito, em 15.10.2010, o demandado Marcondes Pinheiro ja havia substabelecido os poderes da procuracao, em 27.08.2009, para um outro advogado, Jaciratan das Gracas de Aguiar Ramos Filho (OAB/RN-8000). Ao promover a presente acao de improbidade, o proprio orgao autor sustenta que o demandado contou que “tao logo tomou conhecimento da irregularidade de sua representacao, providenciou perante o mandante o substabelecimento sem reservas de poderes para outra advogada.” Contudo, entende o autor que “Tais argumentos nao merecem acolhida em favor de nenhum dos demandados, isso porque, ao atuarem nas causas acima mencionadas, eles foram de encontro aos interesses do proprio Estado, comportamento que revela desrespeito aos principios constitucionais da Administracao Publica.” Buscando justificar a sua tese, o Parquet argumenta que as acoes civis publicas ajuizadas pelo Ministerio Publico, por sua propria natureza, “visam a protecao de direitos indisponiveis do Estado, de modo que, independentemente de ter sido promovido o ingresso do ente federado na demanda, ha claro interesse publico no feito.” Este ponto levantado pelo Ministerio Publico – interesse publico no feito – me parece muito importante para analisar se a conduta do demandado, em tendo promovido a defesa previa de um terceiro em duas acoes de improbidade (em uma terceira, o advogado nao assinou a defesa), pode levar inexoravelmente a caracterizacao de lesao a uma regra juridica e, por via reflexa, lesionar principios da Administracao Pùblica. Cumpre indagar qual seria o sentido e o alcance da nocao de interesse publico na situacao posta. Como se sabe, embora a doutrina brasileira ainda nao venha trabalhando com mais afinco na distincao entre interesse publico primario e secundario, o que se conclui dos ensinamento doutrinarios e que o primeiro – interesse primario – e a razao de ser do Estado, sintetizado nos fins que cabe a ele promover, quais sejam, justica, seguranca e bem-estar social. Sao, pois, os interesse de toda a sociedade. Ja o segundo – interesse secundario – e o da pessoa juridica de direito publico que venha a ser parte em uma determinada relacao juridica, seja 01456900 ela a Uniao, Estado-membro, Municipio e suas autarquias. Ou seja, pode ser identificado como o interesse do erario, portanto, interesse patrimonial. E tal distincao, embora sem uma densa elaboracao doutrinaria em nosso direito, e perceptivel na Carta da Republica, pois dela decorre, por exemplo, a atuacao do Ministerio Publico na defesa do interesse publico primario, e a atuacao da Advocacia Publica na defesa do interesse secundario. Nao e estranha, pois, tal distincao, ao nosso ordenamento juridico. Alias, antes mesmo da Carta de 1988 ja se podia enxergar a diferenca entre esses interesses, se voltarmos os olhos para a acao popular (Lei nº 4.717/65) e para a acao civil publica (lei nº 7.347/85), ambas reguladas por leis anteriores a Constituicao de 1988 e que se prestam a tutela dos interesse gerais da sociedade, ainda que estejam em conflito com interesses secundarios do ente estatal ou dos proprios agentes politicos. Em que pese a pouca contribuicao doutrinaria sobre o tema, a jurisprudencia recente vem adotando as construcoes teoricas por ela propostas, como se ve nos seguintes julgados recentes do Superior Tribunal de Justica, verbis: “EMENTA: ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. INTERVENCAO DO MINISTERIO PUBLICO. DESAPROPRIACAO INDIRETA. DIVERGENCIA DEMONSTRADA. INTERESSE PUBLICO. AUSENCIA DE OBRIGATORIEDADE. 1. A acao de desapropriacao indireta tem conteudo patrimonial que a vincula ao chamado interesse publico secundario, cuja titularidade e atribuida a Fazenda Publica, devidamente representada em juizo por seus orgaos de procuratura judicial. Ao Ministerio Publico, em regra, cabe a defesa do interesse primario (art. 82, inciso III, CPC). 2. {…}. (ERESP 506226/DF, Rel. Min. Humberto Martins, DJe 05/06/2013. NO MESMO SENTIDO: AR 2896/SP, RESP 801028/DF, RESPE 652621/RJ, AgRg no RESP 115116/GO. (grifamos) Tambem no mesmo sentido foi a proclamacao do RESP 1153076/GO, Rel. Min. Luiz Fux, DJe 9/03/2010, com clara referencia as orientacoes doutrinarias mais abalizadas, e onde se destaca claramente que o interesse que e indisponivel e o interesse primario, e nao o interesse da administracao, cujos trechos merecem transcricao, dada a pertinencia com o tema em debate na presente acao. “EMENTA: PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. ACAO DE INDENIZACAO. COMPANHA NACIONAL DE ABASTECIMENTO (CONAB). SAFRA DE ALGODAO. CLASSIFICACAO DO PRODUTO APONTADA COMO FRAUDULENTA EM ACOES DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. DESNECESSIDADE DE INTIMACAO DO MINISTERIO PUBLICO PARA TODOS OS ATOS DO PROCESSO. 1 A exegese do disposto no art. 82, III, do CPC, impoe a distincao jus-filosofica entre o interesse publico primario e o interesse da administracao, cognominado interesse publico secundario. (Licoes de Carnelutti, Renato Alessi, Celso Antonio Bandeira de Melo e Min. Eros Roberto Grau. 2. O Estado, quando atestada a sua responsabilidade, revela-se tendente ao adimplemento da correspectiva indenizacao, coloca-se na posicao de atendimento ao interesse publico. Ao reves, quando visa a evadir-se de sua responsabilidade no afa de minimizar os seus prejuizos patrimoniais, persegue nitido interesse secundario, subjetivamente pertinente ao aparelho estatal em subtrair-se de despesas, engendrando locupletamento a custa do dano alheio. 3. Deveras, e assente na doutrina e na jurisprudencia que indisponivel e o interesse publico, e nao o interesse da administracao. Nessa ultima hipoteses, nao e necessaria a atuacao do Parquet no mister de custos legis, maxime porque a entidade publica empreende a sua defesa atraves de corpo proprio de profissionais da advocacia da Uniao. Precedentes jurisprudenciais que se reforcam, na medida em que a atuacao do Ministerio Publico nao e exigivel em varias acoes movidas contra a administracao, como, v.g., soi ocorrer, com a acao de desapropriacao prevista no Decreto-lei n. 3.365/41 (Lei de Desapropriacao). 4. In genere, as acoes que visam ao ressarcimento pecuniario contem interesses disponiveis das partes, nao necessitando, portanto, de um orgao a fiscalizar a boa aplicacao das leis em prol da defesa da sociedade. 5. {…}. 6.{…}. 7. Por fim, cumpre registrar, o interesse publico justificador da intervencao do Ministerio Publico, nos moldes do art. 82, III, do CPC, nao se confunde com interesse patrimonial da Fazenda Publica na lide. Precedentes do STJ: RESP 465580/RS, Rel. Min. Castro Meira, DJ 08/05/2006; RESP 466500/RS, Rel. Min. Denise Arruda, DJ 03.04.2006, RESP 490726/SC, Rel. Min. Teori Zavascki, DJ 21/03/2005.” Obviamente que o interesse secundario e importante, mormente em se tratado de situacoes de defesa do erario, como pode ocorrer em algumas acoes de improbidade administrativa. Ate porque aquele que se apropria de recursos do erario ou os desvia em favor de terceiros (por exemplo, nos casos do art. 9º, I e 10, I, LIA), quando for o caso, esta atentando contra o interesse primario, ou seja, contra os meios financeiros que o Estado detem para realizar os investimentos sociais e para a prestacao dos servicos publicos. Diante do que posto pela doutrina e pela jurisprudencia, e possivel enxergar que o interesse publico secundario, ou seja, o da pessoa juridica de direito publico, jamais podera desfrutar de supremacia a priori e supremacia abstrata em face dos interesseS do particular. Outra nao e a conclusao de LUIS ROBERTO BARROSO, celebrado professor e constitucionalista, recem nomeado Ministro do STF, quando, prefaciando obra que trata do tema envolvendo conflito entre interesse publico e privado, assim lecionou: “Se ambos entrarem em rota de colisao, cabera ao interprete proceder a ponderacao adequada, a vista dos elementos normativos e faticos relevantes para o caso concreto.” (grifamos). Diferente parece nao ser a percepcao de CELSO ANTONIO BANDEIRA DE MELLO, quando afirma que “O Estado, concebido que e para a realizacao de interesses publicos (situacao, pois, inteiramente diversa da dos particulares), so podera defender seus proprios interesses privados quando, sobre nao se chocarem com os interesses publicos propriamente ditos, coincidam com a realizacao deles.” O presente caso de improbidade administrativa, sustentado na inicial, nao e de apropriacao de bens publicos ou de recursos do erario estadual, mas sim de uma possivel lesao a principios da Administracao Pùblica. Partindo-se da propria narrativa da inicial, e diante da minuciosa analise de todas as provas documentais dos autos, nao se revela em nenhum momento qualquer lesao ao erario publico no fato do demandado Wellington Moreira ter patrocinado a defesa previa de uma pessoa privada em acoes civis publicas, ainda que nelas tenha manifestado interesse o ente publico. Mesmo que houvesse interesse patrimonial para o Estado em decorrencia, ao menos em tese, de uma possivel lesao ao erario (que nao ocorreu no caso), deve ser considerado como interesse secundario, e nao como primario. E foi exatamente por isso, por enxergar que se trata de interesse secundario, que o Estado do Rio Grande do Norte declinou da sua intervencao na presente acao de improbidade administrativa, como visto acima, consoante as ponderacoes feitas pelo Exmo. Sr. Procurador Geral do Estado, especialmente no que pertine ao interesse processual do Estado para fins de acao de improbidade administrativa, com transcricao doutrinarias acerca da manifestacao dessa pretensao na lide posta. Portanto, mostra-se necessario, a vista do que afirmado na inicial e do que encontrado na prova documental dos autos, e consoante a licao de BARROSO, acima transcrita, proceder a ponderacao em razao da possivel rota de colisao entre o interesse secundario do Estado do Rio Grande do Norte, que restaria consubstanciado, como defende o autor, na manifestacao de interesse do ingresso no polo ativo das acoes civis publicas mencionadas, e o interesse privado, calcado na atuacao parcial do demandado Wellington Moreira, na condicao de advogado, na defesa de um reu naquelas acoes, o que teria, segundo a otica do autor, resultado em “interesses conflituosos com os interesses indisponiveis dos 01456900 referidos orgaos e do proprio Estado do Rio Grande do Norte” (a afirmacao do autor tambem se refere ao outro demandado, Heriberto Escolastico Bezerra). Tres elementos faticos se afiguram fundamentais para a analise que se faz em relacao ao interesse secundario do Estado do Rio Grande do Norte naquelas acoes civis publica. O primeiro e o fato de que o demandado Wellington Moreira, mesmo tendo efetuado, tao somente, defesas previas do reu em duas acoes (numa terceira, a defesa nao foi por ele assinada, mas sim por outro advogado, o que revela que, tecnicamente, sequer houve sua atuacao efetiva), substabeleceu os poderes que lhes foram outorgados pelo reu tao logo houve a manifestacao de interesse do Estado do Rio Grande do Norte no feito. O segundo e o fato de que todas as acoes civis ja referidas foram rejeitadas pelo Judiciario, duas delas com sentencas confirmadas pelo Tribunal de Justica, que assim como o juiz de primeiro grau, nao reconheceu a pratica de atos de improbidade administrativa. Se nao houve lesao a nenhum interesse primario ou secundario, posto que nao reconhecida sequer a pratica de atos de improbidade, me parece tornar-se desarrazoada qualquer sancao ao demandado tao somente por causa do patrocinio das defesas previas. O terceiro e o fato de que, mesmo que se considere o interesse secundario do Estado em razao da sua manifestacao (figurar no polo ativo) nas acoes civis, nao houve, em nenhuma daquelas demandas, qualquer prejuizo de ordem patrimonial para o ente publico, consoante restou reconhecido nas decisoes judiciais proferidas. Portanto, ainda que tenha havido a manifestacao de interesse do ente publico nas acoes – interesse secundario, repita-se – a ausencia de lesividade ao erario autoriza a ponderar os interesses postos em jogo, quais sejam, o interesse secundario do Estado, e o interesse privado, entao presente, consistente nao so no direito de defesa de um particular em um processo judicial, mas tambem na atuacao privada, ainda que momentanea, de um advogado que patrocinou a defesa. Nao custa reforcar que o interesse do ente estatal, deduzido naquelas situacoes, e secundario, mesmo que se tratem de acoes de improbidade. E tanto isso e verdade que o proprio legislador facultou (nao obrigou) o ente publico a intervir nas acoes de improbidade administrativa, consoante diccao do § 3º do art. 17 da Lei nº 8.429/92. Nao se trata, pois, de interesse primario, este sim, de titularidade de toda a sociedade e que o Ministerio Publico pode defender pela via da acao judicial, ja que legitimado para tanto pela Carta da Republica. Se trata, isto sim, de interesse secundario do Estado, interesse de natureza patrimonial, que nao restou lesionado naquelas acoes, como ja se viu, muito menos em decorrencia dos atos que geraram a presente acao de improbidade em desfavor dos demandados Heriberto Escolastico Bezerra e Wellington Moreira. Assim, me parece que o confronto de interesses, que segundo o orgao autor se deu em razao da intervencao do demandado Wellington Moreira, como advogado, em favor de uma pessoa privada nas acoes de improbidade em que o Estado do Rio Grande do Norte manifestou interesse, nao tem o condao de atrair, por si so, as pesadas sancoes de improbidade administrativa em desfavor do demandado. Se o seu comportamento e passivel de censura, ja que ocupava um cargo publico e como advogado deveria saber que o Estado poderia intervir nas acoes civis publicas, nem por isso pode-se dizer que a sua atuacao, na defesa momentanea (apenas a defesa previa) de uma pessoa privada, possa ter lesionado tao gravemente o disposto no inciso I do art. 30 da Lei nº 8.906/94 (EAOAB) e, por conseguinte, ferido o principio da moralidade administrativa. Ate porque a minima ilegalidade nao pode configurar ato de improbidade. Neste sentido, convem lembrar as palavras de MARCELO FIGUEIREDO, ao comentar o art. 11 da Lei nº 8.429/92, verbis: “Deveras, novamente a lei peca por excesso ao equiparar o ato ilegal ao ato de improbidade; ou, por outra, o legislador, invertendo a diccao constitucional, acaba por dizer que o ato de improbidade pode ser decodificado como toda e qualquer conduta atentatoria a legalidade, lealdade, imparcialidade, etc. Como se fosse possivel, de uma penada, equiparar coisas, valores e conceitos distintos. O resultado e o arbitrio. Em sintese, nao pode o legislador dizer que tudo e improbidade.” Ainda em relacao ao contexto fatico, resta evidente que se a hipotese fosse de colisao entre o interesse privado e o interesse publico primario, seria mais dificil (alem de nao ser mais facil), mas nao seria impossivel, ponderar os interesse postos em jogo. Mas nao e essa a hipotese em questao. Trata-se, tao somente, de um conflito minimo entre um interesse secundario da Fazenda Publica Estadual e um interesse privado, momentaneamente exercitado pelo nobre advogado, fruto, talvez, permito-me dizer com todas a venias, de uma inabilidade, inexperiencia ou mesmo descuido, que nao pode ser exacerbado, ao extremo, a ponto de qualifica-lo como um grave ato improbo apto a atrair as pesadas sancoes do inciso III do art. 12 da LIA. Alias, neste ponto e conveniente observar que o Ministerio Publico defendeu que os atos improbos atribuidos aos demandados (Heriberto Bezerra e Wellington Moreira) consistiram em lesao aos principios da legalidade e moralidade, portanto, lesao ao art. 11, da LIA. Para tanto, pediu ao final a imposicao aos demandados das sancoes do inciso III do art. 12 da mesma Lei. Ora, a considerar que nenhum dos demandados ocupa qualquer cargo publico – Heriberto Bezerra e advogado privado, e Wellington Moreira nao ocupa mais o cargo comissionado na SESED, pelo que se constata dos autos -, e, portanto, nao recebem remuneracao dos cofres publicos, e ainda considerando que nao houve, no caso, nenhuma lesao ao erario (e tal hipotese sequer foi ventilada na inicial), mas tao somente, segundo a inicial, lesao a principios (legalidade e moralidade), nao se poderia, data venia, aplicar as sancoes de ressarcimento integral do dano, perda da funcao publica, pagamento de multa civil de ate 100 vezes o valor da remuneracao percebida pelo agente publico, sendo possivel aplicar, tao somente, as demais sancoes previstas no citado inciso III do art. 12 da LIA. Portanto, essa e mais uma razao para que se busque ponderar os interesses que se conflitaram momentaneamente, de sorte a sindicar se realmente restaria configurado o ato improbo do art. 11 da LIA, a ponto de atrair a aplicacao das demais sancoes do dispositivo mencionado. Ate porque tal ponderacao, no que pertine a aplicacao de sancoes da LIA, nao pode deixar de ser feita pelo juiz, segundo exegese que resulta do disposto no Paragrafo unico do art. 12, da Lei nº 8.429/92. Ainda a respeito da ponderacao de interesses, convem lembrar, dada a importancia do tema, que nao se sustenta mais, nos dias atuais, a velha e classica visao de interesse publico como algo superior e diferenciado dos demais interesses existentes no seio da sociedade. O Direito Administrativo evoluiu muito nas ultimas decadas, deixando de ser uma mera relacao vertical entre o Estado e o cidadao, passando a ser um Direito garantidor da melhor satisfacao possivel dos direitos dos ada melhor satisfacao possivel dos direitos fundamentais dos administrados. Conforme anota ALEXANDRE SANTOS DE ARAGAO, apesar dessa evolucao, “muitas vezes as lides envolvendo o Direito Publico ainda se veem turvadas por uma generica e mitica invocacao do “interesse publico”, ou de subespecies suas como “ordem publica”, “saude publica”, bem-estar da coletividade”, “moral publica”, etc, que, ao entrar em ponderacao com quaisquer ou

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