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No recente julgamento do STF, ficou decidido que a Corte somente processará aquele senador ou deputado que for investigado ou acusado por fatos relacionados ao mandato e em função do cargo. E também decidiu-se que, uma vez encerrada a fase de coleta das provas, mesmo que o mandato do investigado ou réu tenha se encerrado, a competência do Tribunal permanece. A decisão atinge apenas 1% dos 54.990 beneficiados pelo foro privilegiado no Brasil. e ainda deve gerar tumultos processuais grandes no próprio STF, criando incidentes nos processos onde aplicável, pois remeterá a inúmeras controvérsias.
A prevalecer essa recente tendência da Corte em mudar seus entendimentos em curto prazo, imagine-se a perspectiva de insegurança jurídica em face de uma eventual alteração de interpretações no horizonte, pois foi por maioria o entendimento sobre prerrogativa de foro, tal como ocorreu no caso da deliberação da matéria sobre a execução da pena a partir das decisões de segunda instância.
Relembre-se que essa decisão sobre prerrogativa de foro foi proferida numa Questão de Ordem relativa à Ação Penal 937, que envolve o Prefeito de Cabo Frio (RJ). Pode-se confiar na estabilidade desse entendimento, eis uma questão fundamental?
Se tomarmos como referência o que está ocorrendo com o debate sobre prisão em segunda instância, que se consolidou em fevereiro de 2016, e depois em outubro do mesmo ano, mas agora experimenta uma reviravolta, o que poderá ocorrer com a prerrogativa de foro?
Cuida-se de uma decisão de enorme impacto na vida nacional e repercussões gigantescas em toda a Justiça brasileira. As consequências mais imediatas, inclusive, sinalizam uma imensa burocracia na tramitação dos processos e multiplicação de incidentes e debates formais. Terra fértil para os processualistas.
Há uma outra preocupação intrigante: se a prerrogativa de foro é relevante para os processos criminais e merece uma interpretação da Corte Constitucional, tal como proclamado, incompreensível que as ações de improbidade fiquem de fora.
O que é a improbidade? São ilícitos paralelos aos crimes, tipificados na Lei 8.429/92, cuja natureza não é penal, mas de direito administrativo sancionador. São penalidades severas, que afetam as liberdades individuais. Para essas ações prevaleceria interpretação literal da regra constitucional?
Ou seja: para prisão em segunda instância, não há interpretação literal; para compreender o texto da prerrogativa de foro dos senadores e deputados, não há interpretação literal; mas para deixar de fora os acusados nas ações de improbidade administrativa, que estão expostos às sanções de suspensão de direitos políticos, perda do cargo, interdições de direitos e sistema do direito administrativo sancionador (cujo regime jurídico historicamente importa as regras e princípios do direito penal por analogia), aí sim é cabível a interpretação literal?
Entendo que, no mínimo, o STF deveria atuar de modo coerente. O saudoso Ministro Teori Zavaski defendia a prerrogativa de foro nas ações de improbidade, tal como nas ações penais, acompanhando o regime jurídico-penal para o regime jurídico do direito administrativo sancionador.
Segurança jurídica é um valor essencial às democracias contemporâneas. E nela se insere o ideário da coerência das decisões judiciais e da jurisprudência. Se não houver prerrogativa de foro para ninguém, isso valerá para ações penais e de improbidade. Se houver para ações penais, em razão da relevância da função, para essas mesmas autoridades será necessário estender idêntica proteção no âmbito da improbidade, pois do contrário haverá o risco de grave incongruência inclusive de decisões judiciais.
Fábio Medina Osório é advogado e ex-ministro da Advocacia-Geral da União
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